06 dezembro 2010

Petite Messe Solennelle



Há uns dias tinha mais uma vez me queixado da minha condição insular, da centralidade da cultura nacional em Lisboa e da impossibilidade de assistir à interpretação pelo Coro do S. Carlos, na Igreja de São Roque, à “Petite Messe Solennelle”, de Gioachino Rossinni.
Quis o destino (para quem acredita nestas coisas) que se repetisse a apresentação no Salão Nobre do Teatro S. Carlos e que eu me encontrasse em Lisboa no passado sábado, 4 de Dezembro. Não hesitei e inclui no meu programa a ida ao S. Carlos às 18h00. Combinei com um amigo, que me arranjou os ingressos e… fomos. Não podia perder uma das minhas missas dilectas havendo aquela oportunidade.
Rossini designou a “Petite Messe”, como sendo o seu “último pecado da velhice”. Já estava aposentado há 30 anos, quando, aos 75 anos, por solicitação do conde Pillet-Will, Rossini se decidiu lançar na aventura de compor uma missa completa.
Como se tentasse redimir-se de negligenciar o Criador em boa parte de sua obra, escreveu o seguinte:"Bon Dieu; la voilà terminée, cette pauvre petite messe. Est-ce bien de la musique sacrée que je viens de faire, ou bien de la sacré musique ? J'étais né pour l'opera buffa, tu le sais bien ! Peu de silence, un peu de coeur, tout est là. Sois donc béni et accorde-moi le Paradis."
Na verdade, “Petite Messe” (pequena missa), nada tem de pequena, uma vez que dura aproximadamente 90 minutos, contendo, simultaneamente, uma candura e uma grandeza profundas que só pode emocionar quem alma tiver. Simples e clara nas formas e modesta no seu efectivo vocal e instrumental, a missa está escrita para quatro solistas, coro misto, piano e harmonium. Não é isto, porém, que lhe nega momentos magestosos e fulgurantes.
No S. Carlos a Direcção Musical ficou a cargo do maestro Giovanni Andreoli e contou com as participações da soprano Maria do Anjo Albuquerque, da mezzo-soprano Natália Brito, do tenor Carlos Silva e do barítono Simeon Dimitrov, bem como com as participações de Nuno Lopes no harmonium e de João Paulo Santos ao piano.
Estamos a falar de um verdadeiro “testamento musical”, se assim podemos chamar, já que a esta obra não se seguiu nenhuma outra digna de registo, a não ser pequenas peças de circunstância, como o hino a Napoleão III, composto para a exposição de Paris.
Na Petite Messe, Rossini colocou toda a sua sabedoria, fervor e audácia. O resultado é um olhar melancólico pelo passado, com uma roupagem de olhos postos na modernidade.
A partitura está dividida em duas partes bem distintas, com 7 partes cada uma. A primeira formada pelo Kyrie e pelo Gloria com suas subdivisões, e a segunda pelo Credo, um Prélude Religieux instrumental tocado durante o Ofertório, o Sanctus, o Salutaris e o Agnus Dei.
Ao contrário do Stabat Mater, que é impetuoso e passional, a Petite Messe, escolheu a delicadeza e a intimidade. As nuances fortes para trechos como o início do Glória e do Cum Sancto Spiritu; as partes extremas do Credo são ligadas tematicamente; o solene Prelúdio religioso; as aclamações do Sacntus e do Hosanna do Sanctus e os últimos compassos do Dona Nobis Pacem proclamado sobre um mi maior triunfal. Rossini intitulou a “Petite Messe” de “Solennelle”, porque efectivamente são marcantes os tempos de marcha e os tempos majestosos.
A ter de destacar algo: Impressionou-me particularmente a interpretação de DOMINE DEUS, no Glória, do tenor Carlos Silva, numa interpretação na melhor tradição do bel canto – como a peça pede! – ficando no final totalmente emocionado com o AGNUS DEI na voz da mezzo-soprano Natália Brito. Uma palavra para a prestação do pianista João Paulo Santos: impecável.

0 comentários:

Enviar um comentário