16 junho 2011

A David Mourão-Ferreira




No dia em que se assinalam 15 anos sobre o falecimento do ilustre Professor David Mourão-Ferreira, o Ex Libris comemora a efeméride deixando aqui um dos seus mais belos poemas.


Memória          

Tudo que sou, no imaginado
silêncio hostil que me rodeia,
é o epitáfio de um pecado
que foi gravado sobre a areia.

O mar levou toda a lembrança.
Agora sei que me detesto:
da minha vida de criança
guardo o prelúdio dum incesto.

O resto foi o que eu não quis:
perseguição, procura, enlace,
desse retrato feito a giz
pra que não mais eu me encontrasse.

Tu foste a noiva que não veio,
irmã somente prometida!
— O resto foi a quebra desse enleio.
O resto foi amor, na minha vida.


David Mourão-Ferreira, in "Tempestade de Verão"


* Fica como sugestão um documentário sobre a vida e obra do autor: http://www.youtube.com/watch?v=oiEnNfUx6d8

04 junho 2011

Novo colaborador

O Ex Libris recebeu mais um colaborador distinto - o meu caro Zé Luís - que vem trazer, com a sua personalidade sui generis, um contributo de valor para este espaço, onde o saber é tido como uma das coisas mais belas e estimáveis. Muito bem-vindo, caríssimo Zé, e obrigado por te juntares a nós!

01 junho 2011

A Eterna Criança

Les Jeunes Baigneuses, Bouguereau (1825-1905)


Com a força do seu olhar intelectual e da sua penetração espiritual cresce a distância e, de certo modo, o espaço que circunda o homem: o seu mundo torna-se mais profundo, avistam-se continuamente estrelas novas, imagens novas e novos enigmas. Talvez tudo aquilo em que o olhar do espírito exercitou a sua sagacidade e profundeza tenha sido apenas um pretexto para este exercício, um jogo e uma criancice e infantilidade. E talvez um dia os conceitos mais solenes, os que provocaram maiores lutas e maiores sofrimentos, os conceitos de «Deus» e do «pecado», não signifiquem, para nós, mais do que um brinquedo e um desporto de criança significam para um velho, - e talvez o «velho homem» tenha, então, necessidade de um outro brinquedo ainda e de um outro desgosto, - por continuar a ser muito criança, eterna criança!


Friedrich Nietzsche, in 'Para Além de Bem e Mal'